COLÓQUIO
 
MEDO
FREEZE!
Alena Alexandrova (NL)
O MEDO, ENTRE O VISÍVEL E O INVISÍVEL
João Norton de Matos SJ
MEDO
Rosa Maria Mota
Moderado por Kadri Mälk
17 de setembro, sexta
18h–21h
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«Unclaimed Images», 2021. Projeto em curso de Alena Alexandrova e Johannes Schwartz
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«Unclaimed Images», 2021. Projeto em curso de Alena Alexandrova e Johannes Schwartz
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FREEZE! As imagens estão paradas. Por vezes têm o poder de nos aquietar, de nos imobilizar. Fixos ao nosso lugar, somos reduzidos ao ato de olhar, ficamos petrificados. Pode-se dizer que, nesse momento, tornamo-nos uma imagem. A história do medo, paralisador, e a petrificação são um motivo visual fértil, associado com a mítica Medusa,o belo ou muito feio monstro decapitado por Perseu. Esta história alia o olhar, decapitação, frontalidade, desvio do olhar, invisibilidade. Também é um motivo de produção de imagens como resultado de um medo intenso. O olhar da Medusa conserva o seu poder de petrificar mesmo depois de morta. O seu rosto é persistentemente descrito como frontal e frontalidade é um modo de se dirigir diretamente a quem a observa. Um olhar ousado, ela desafia-nos a olhar e paralisar, ou temos de desviar o olhar, evitar o dela e mantermo-nos vivos. Esta é uma história do ou de olhar as imagens e do nosso envolvimento emocional com elas, o mortal feitiço de olhar. É também uma história de transportar a cabeça como uma arma que simultaneamente mata e faz imagens. Lembra alguma coisa? Esta é uma história de algo que pertence à fotografia — a imagem produzida no interior de um aparelho cujo olhar vazio paralisa as coisas vivas em imagens paradas. A cabeça da Medusa, ou gorgoneion, aparece em armaduras, arquitetura, joalharia, roupa, cerâmica. Este motivo e a sua transformação num objeto que pode ser usado, marca o nosso desejo de proteção e reconhece simultaneamente o nosso medo. É também um motivo de iconopoeisis, um momento especial de criação instantânea de imagens que necessita de uma mão para as moldar, formar ou modelar. Os dois protagonistas contemporâneos que serão abordados no colóquio são a ação fotográfica e o nosso desejo de usar objetos no corpo, que entre outras coisas, é ainda o nosso desejo arcaico de proteção.  
 
ALENA ALEXANDROVA (Amesterdão) é especialista em teoria da cultura e curadora independente. Ensina no departamento de Artes Visuais e Fotografia da Gerrit Rietveld Academy em Amesterdão. Obteve o doutoramento pela Universidade de Amesterdão. Está a escrever o livro Anarchic Infrastructures: Re-Casting the Archive, Displacing Chronologies. É autora de Breaking Resemblance. The Role of Religious Motifs in Contemporary Art (Fordham University Press, 2017), publicou internacionalmente nos campos da estética, performance e estudos visuais e contribui regularmente para exposições e catálogos. Fez a curadoria de exposições sobre o conceito de «anarqueologia». Ensinou no Master of Fine Arts, Faculty of Fine Art, Music and Design, Universidade de Bergen, Noruega, e no Dutch Art Institute, Arnhem. Foi investigadora convidada no Humanities Center, Universidade Johns Hopkins, Atelier Holsboer, Cité des Arts, em Paris, e palestrante convidada na Academy of Fine Arts, em Nuremberga.
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Inês Nunes
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Inês Nunes
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O MEDO, ENTRE O VISÍVEL E O INVISÍVEL Num primeiro momento escutamos diversas vozes provenientes da linguística, da psicologia, da psiquiatria, da religião. O que nos dizem sobre o medo é apenas um ponto de partida. Interessam-nos mais propriamente as expressões plásticas do medo nas suas relações com o corpo e a proteção. É na interseção do corpo vulnerável entendido como existência ameaçada e a proteção expressa em artefactos, enquanto respostas da subjetividade estética e artística, que encontramos um terreno experimental para uma hermenêutica do medo. Partimos das obras da exposição Suor Frio da Bienal, que intuitivamente pareçam querer elucidar-nos. Escolhemos peças nos diversos polos da exposição, entre o Museu da Farmácia e Igreja de S. Roque, passando pelo museu e a galeria, entendendo esta geografia desde logo orientada a uma rizomática, onde o medo se manifesta em tensões diversas entre o próximo e o longínquo, a natureza e a cultura, a vida e a morte. Como nos fala a visibilidade e a legibilidade do corpo e da proteção acerca da invisibilidade do medo e das suas forças? Como nos desvela a intuição artística ângulos cegos das ciências homem ou se relaciona com elas? É nesta direção que interrogamos algumas obras de arte patentes na Bienal.
 
JOÃO NORTON DE MATOS (Lisboa, 1963) é jesuíta desde 1990, foi ordenado padre em 2002. É professor auxiliar convidado de Estética e Teologia na Universidade Católica Portuguesa. Trabalha na Brotéria (revista e centro cultural) e é pároco da igreja da Encarnação, em Lisboa. Em 2018, defendeu a tese de doutoramento em Teologia Fundamental — sobre a crise moderna da arte sacra — no Centre Sèvres, Facultées jésuites de Paris, onde, depois da conclusão da licenciatura pela Faculdade de Teologia da Universidad Pontificia de Comillas, em Madrid, completou o segundo ciclo na mesma área de estudos. Fez o DEA em Estética e Filosofia da Arte na Université Catholique de Louvain, tendo anteriormente completado a licenciatura em Filosofia pela Faculdade de Filosofia de Braga da Universidade Católica Portuguesa, a licenciatura em Arquitetura pela Faculdade de Arquitetura da Universidade Técnica de Lisboa e frequentado o curso de Desenho Artístico no Ar.Co — Centro de Arte e Comunicação Visual, em Lisboa.
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Rosa Maria Mota: «Amuleto», c. 1960, Aro de suspensão para amuletos de Fernando Martins Pereira Lda. e medalhas religiosas de várias proveniências inseridas pela proprietária (ouro, esmalte e materiais orgânicos), Ø c. 5 cm. Cortesia e coleção da Ourivesaria Quilate, Viana do Castelo. Fotografia: Vítor Roriz
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Rosa Maria Mota: «Amuleto», c. 1960, Aro de suspensão para amuletos de Fernando Martins Pereira Lda. e medalhas religiosas de várias proveniências inseridas pela proprietária (ouro, esmalte e materiais orgânicos), Ø c. 5 cm. Cortesia e coleção da Ourivesaria Quilate, Viana do Castelo. Fotografia: Vítor Roriz
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MEDO
a noite chega irrequieta de cíclicos ventos, cintilam peixes nas paredes do quarto
durmo sobre as águas e tenho medo (...)
Al Berto in O Medo 
O medo é inerente à condição humana. Se, por um lado, foi o medo que permitiu a sobrevivência das espécies, por outro, muitos medos arquitectados serviram como meio de controle das populações. Além destes, existem os medos cíclicos, que, com diferente intensidade, nos amedrontam a todos: os medos das doenças, das pestes, da penúria, da infelicidade, de tudo o que nos ameaça e destrói e sobre o que não temos controle. E existem ainda os medos do irracional, dos fantasmas, dos maus olhados e dos bruxedos, fundamentados em mitos ancestrais que passam de geração em geração e que formam o imaginário e o sentido mágico de cada sociedade.
Para combater todos os medos que assolaram o homem, desde sempre se utilizaram componentes encantatórios, que se misturaram com elementos decorativos, muitas vezes confundindo os usos. Apesar da cultura tradicional portuguesa se encontrar fortemente condicionada pelo catolicismo, as peças de índole religiosa misturaram-se com outras que veiculavam crenças mágicas, usadas juntamente com os ornamentos da figura humana. O significado e poder místico destes amuletos estaria ligado ao material e ao formato apotropaicos e à sua inerente simbologia e, durante séculos, contra ventos e marés, apaziguaram medos atávicos. Rosa Maria Mota
 
ROSA MARIA MOTA (Lousada, Porto, 1959) é investigadora do CITAR – Centro de Investigação em Ciência e Tecnologia das Artes da Universidade Católica Portuguesa, universidade onde, como bolseira da Fundação para a Ciência e a Tecnologia, obteve, após a licenciatura em Arte e Património, o grau de doutor e o de mestre. O seu trabalho de pesquisa incide sobre o ouro popular e o seu percurso, nos séculos XIX e XX, no Norte Portugal. Sobre a temática, publicou livros e artigos, fez apresentações públicas em Portugal, Espanha e Brasil. Foi professora convidada na Universidade Católica Portuguesa, realizou vídeos e participou em documentários e programas de televisão relacionados com o fenómeno da ourivesaria popular em Portugal.
KADRI MÄLK(Tallinn, 1958) iniciou os seus estudos de Pintura na Tartu Kunstiakadeemia em 1977, e formou-se na Eesti Kunstiakadeemia, em 1986, com a professora Leili Kuldkepp. Entre 1986 e 1993 trabalhou como artista independente. Em 1993, entrou para o Instituto de Design de Lahto, na Finlândia, para estudar Gemologia com Esko Timonen e completou os seus estudos no atelier de lapidação de Bernd Munsteiner na Alemanha. Colabora com a Eesti Kunstiakadeemia desde 1989 e é diretora e professora no departamento de joalharia desde 1996. Realizou numerosas exposições, a solo e coletivas, e proferiu conferências, tanto na Estónia como internacionalmente. E a sua obra integra várias coleções públicas e privadas. Autora e editora de livros e textos sobre joalharia desde os anos 1990, incluindo: Millennium (1994, 1997), Kadri Mälk (2001), Metal 1, 2, 3 (1999, 2004, 2014), Twilight (2005), Chroma/Monochroma (2006), Just Must (2008), Õhuloss (2011), a edição especial Kunst.ee sobre joalharia (2005, 2012) e os livros de artista Testament (2016) e HUNT: Kadri Mälk’s Jewellery Collection (2020). É joalheira de profissão e metafisíca por ocupação. A marca estética de Kadri é sombria, esotérica, poética e sobrenatural. Uma das suas paixões é colecionar joalharia. Vive e trabalha na Estónia.